Felca é um dos criadores de conteúdo mais autênticos e imprevisíveis da cena atual. Sua trajetória até o topo não foi planejada, mas construída em cima de humor, críticas afiadas e uma capacidade única de transformar qualquer assunto em entretenimento.
Seus primórdios no YouTube eram pura experimentação. Vídeos com cara de amador, feitos na simplicidade, apostando tudo no improviso e na personalidade. O conteúdo girava em torno do cotidiano, mas visto através de uma lente distorcida de sarcasmo — um estilo que viraria sua marca registrada.
Parte desse olhar ácido vinha das próprias experiências de Felca. Durante a escola, ele enfrentou anos de bullying, marcados não só por agressões físicas e verbais, mas, sobretudo, pelo isolamento. Em suas palavras, “o que mais dói não são os apelidos, não é nem a agressão física. É o isolamento… você se sente invisível”. Esse passado ajudou a moldar o humor direto e por vezes desconfortável que se tornaria tão característico em sua obra.
O ponto de virada definitivo
O ponto de virada veio com uma brincadeira despretensiosa envolvendo um produto de beleza, que era vendido por uma grande influenciadora. Felca começou a fazer graça em cima da proposta “milagrosa” do item, em vez de seguir o roteiro comum de resenha ou explicação.
O resultado foi um vídeo curto, simples, mas que refletia exatamente o estilo que o público viria a amar: humor improvisado, com comentários ácidos, cara séria e uma dose de nonsense.
Esse vídeo rapidamente começou a circular fora do seu público habitual, sendo compartilhado em grupos, páginas de memes e no Twitter (X). Foi a primeira vez que o nome de Felca ganhou destaque para além da bolha de seguidores próximos, mostrando que ele tinha potencial para viralizar em escala nacional.
A repercussão foi tão grande que o vídeo marcou a “virada de chave”: de criador “amador” para figura promissora do YouTube brasileiro. A partir dali, Felca entendeu que poderia usar esse mesmo estilo debochado para abordar qualquer tema — desde assuntos leves até críticas mais sérias, como faria depois com as bets e a adultização.
Posição firme contra as Bets e a “Adultização”
Um episódio importante para Felca foi sua entrada na discussão sobre o universo das “bets”, as casas de apostas online que se espalharam pelo Brasil em ritmo acelerado. Enquanto boa parte dos influenciadores promovia esse mercado em troca de patrocínio, Felca fez o movimento oposto: criticou abertamente a prática, expondo os riscos de endividamento e mostrando como as promessas de ganhos fáceis eram ilusórias.
A forma como ele abordou o assunto chamou atenção. Felca não usava termos técnicos nem tentava soar como especialista. Ele deixava claro que o humor sarcástico era a porta de entrada, mas a mensagem final era séria: as bets estavam vendendo uma ilusão perigosa, especialmente para os jovens.
Essa postura conquistou respeito e atraiu novos públicos, que começaram a enxergá-lo como alguém disposto a bater de frente com interesses poderosos, mesmo correndo o risco de desagradar marcas ou patrocinadores
Recentemente, Felca voltou a romper a bolha — e desta vez de forma ainda mais contundente — com o lançamento do vídeo ‘Adultização’, publicado em seu canal no YouTube no dia 6 de agosto deste ano. ele discutiu de maneira direta como crianças e adolescentes vêm sendo expostos em plataformas digitais de um jeito que antecipa comportamentos e pressões típicas da vida adulta.
Um dos pontos mais impactantes do vídeo foi quando Felca explicou que é relativamente fácil manipular o algoritmo das redes para ter acesso a esse tipo de conteúdo. Ele alertou que essa exposição pode acabar facilitando a atuação de adultos com intenções maliciosas, destacando a necessidade de maior cuidado e conscientização por parte de pais, responsáveis e da própria plataforma.
A repercussão foi imediata. O vídeo ultrapassou rapidamente mais de 50 milhões de visualizações, entrou em alta no YouTube e gerou cortes no TikTok, threads no X (antigo Twitter) e matérias em portais de entretenimento. Além do impacto nas redes, o conteúdo também provocou discussões sobre responsabilidade legal das plataformas e de criadores de conteúdo.
Alguns órgãos ligados à proteção da infância e adolescência aproveitaram a repercussão para chamar atenção sobre os riscos da exposição precoce de menores na internet. Além disso, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), comprometeu-se a pautar, ainda naquela semana, projetos relacionados ao tema.
Em 11 de agosto, 17 projetos de lei foram apresentados à Mesa Diretora da Casa, muitos dos quais preveem a criminalização da “adultização” e a responsabilização de pais, responsáveis e empresas patrocinadoras em casos de irregularidades.
Essa dimensão legal e social adicionou uma camada de relevância e seriedade ao trabalho de Felca, mostrando que seu conteúdo não apenas entretém, mas também pode provocar reflexões e debates importantes.